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Aqui é o país do futebol... americano!

O esporte da bola oval mostra sinais de força e organização para pegar de vez no Brasil

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“Temos esportes em quantidade. Para que metermos o bedelho em coisas estrangeiras? O futebol não pega, tenham a certeza. Não vale o argumento de que ele tem ganhado terreno nas capitais de importância. Não confundamos.” Assim Graciliano Ramos, autor de Vidas Secas, bradava contra o futuro do futebol no Brasil, em artigo intitulado Traços a esmo, de 1921. Dois anos antes, outro célebre escritor brasileiro, Lima Barreto, criava a “Liga Anti-Futebol”.

Quase 100 anos depois, podemos dizer, com absoluta certeza, que eles erraram. Feio. O futebol chegou e aqui encontrou um ambiente fértil para se desenvolver de maneira própria. O País transformou o esporte elitista e aristocrático dos ingleses em arte e festa do povo brasileiro. Em todo o mundo, somos identificados como o país do futebol.

No fim da década de 1980, início dos anos 1990, outra “coisa estrangeira” chegou ao País. Uma bola oval, alguns equipamentos de jogo, capacetes, chuteiras. “Coisa de gringo”, disseram alguns. “Não vai pegar”, decretaram outros. Hoje, o futebol americano ainda enfrenta resistências semelhantes às que o futebol enfrentou, expressas nas opiniões de Graciliano Ramos e Lima Barreto, mas começa a dar sinais de força e mostra que pode dar certo no país da redonda.

Alguns fatos evidenciam que o esporte nascido nos EUA está caindo no gosto do brasileiro. Em 2011, todos os jogos dos playoffs da NFL foram transmitidos ao vivo pela ESPN. No último dia 5, aconteceu a 46ª edição do Super Bowl, jogo final da Liga Nacional de Futebol Americano. O New York Giants levou a melhor sobre o New England Patriots (21 a 17) e conquistou o quarto título de sua história. Eventos em todo o País promoveram o jogo como uma decisão de Brasileirão. A liga americana realizou, pela primeira vez, uma festa oficial para a partida, a NFL Fan Party, no Bar Maevva, em São Paulo. Foi um sucesso.

Além do crescimento de fãs e de admiradores, há um aumento no número de praticantes. Segundo Flávio Cardia, presidente da Associação de Futebol Americano do Brasil (AFAB), existem mais de dois mil jogadores. O dado mostra que é possível sonhar com o desenvolvimento do esporte por aqui.

Desenvolvimento que pode ser prejudicado por problemas na organização dos torneios. Em 2011, por exemplo, houve dois campeões nacionais. O Brasil Bowl II, torneio organizado pela AFAB, foi vencido pelo Fluminense Imperadores, em decisão contra o Coritiba Crocodiles, no estádio Couto Pereira, em Curitiba.

Já na terceira edição do Torneio Touchdown, o primeiro existente no Brasil, o Corinthians Steamrollers venceu o Vila Velha Tritões e levou o troféu, em São Paulo. O TT é um torneio autônomo, independente da AFAB, que é a instituição reconhecida pela IFAF (International Federation of American Football), órgão máximo do futebol americano no mundo, e também pelo Ministério do Esporte.

A ideia é que haja apenas um campeonato brasileiro, sob a direção da AFAB. No final de 2011, depois de assembleia entre os membros da Associação, ficou decidido que a “... a partir de 2012 a AFAB passará a chancelar/organizar o Campeonato Brasileiro de Futebol Americano, e nenhum time filiado direta ou indiretamente poderá participar de qualquer outra competição independente”.

Ou seja, quem participar, por exemplo, do TT, que deve ser realizado, segundo André Adler, idealizador do torneio, fica automaticamente desfiliado da AFAB e, consequentemente, fora do campeonato brasileiro. Até hoje, meados de fevereiro, mais de 45 times estão inscritos no torneio da AFAB. Até o dia 29, times de todo o País podem entrar na competição. Basta entrar em contato direto com a federação estadual em que se encontra filiado e pedir a inscrição. Saiba mais aqui.

Polêmicas à parte, há uma tentativa de unificar todas as forças presentes para desenvolver o futebol americano no Brasil. O que começou, lá atrás, com a modalidade flag em São Paulo e a beach no Rio virou coisa séria e mais organizada. O presidente da AFAB vê boas perspectivas para o futebol americano aqui.

“A gente já conseguiu coisas que países que estão há décadas não chegam nem aos pés. Mandamos jogadores para o time sub-19 da seleção mundial (leia aqui), temos um campeonato, mais de 60 times equipados. A IFAF vê o Brasil como a bola da vez, querem ajudar o Brasil, Estamos de olho na base, estimulando a formação, porque é importante. Isso garante que não seja um esporte de momento, mas algo para ficar pra sempre”, diz Cardia.

Para Danilo Müller, técnico do São Paulo Storm e da seleção brasileira, o crescimento do esporte é visível. “O crescimento do esporte no Brasil nos últimos cinco anos foi absurdo, tanto em número de fãs como de praticantes. As mídias sociais fizeram um papel importante para que as pessoas do Brasil inteiro se conhecessem, conhecessem o esporte. Assim, nós conseguimos juntar as forças tanto dos times quanto dos estados e federações, para chegar a um campeonato brasileiro de 2012“, analisa.

Aliás, a seleção brasileira realizou, em janeiro, a segunda partida oficial da história, contra o Chile. O time de Müller atropelou o Chile e venceu por 33 a 0, com público de mais de cinco mil pessoas em Foz do Iguaçu. Depois de derrota para o Uruguai há quatro anos, em Montevidéu, a equipe mostrou nítido progresso.

O elenco para o amistoso contra os chilenos foi escolhido em um training camp realizado em São Paulo, em dezembro de 2011. De 100 atletas que compareceram ao Parque Villas-Bôas, em São Paulo, no final de semana dos dias 17 e 18 de dezembro, saíram pouco menos de 50 para integrar a Seleção.

“A AFAB pagou passagem e hospedagem para todos os atletas para o jogo contra o Chile, em 21 de janeiro. É um marco de apoio ao esporte no Brasil, porque eu já viajei para uma dezena de estado sempre custeando do meu bolso. No São Paulo Storm, todo mundo banca o próprio equipamento”, conta Renato Spy, que esteve no jogo no Paraná, revelando as dificuldades, ainda grandes, para um jogador de futebol americano no Brasil.

Sobre dificuldades, Danilo Müller diz que o principal obstáculo na seleção é reunir atletas de todo o Brasil para jogar e treinar. “Falta ainda apoio, patrocínio, que facilitaria muito isso. Um apoio maior, um patrocínio maior, ia ser mais fácil de juntar esses jogadores. E treinar mais! Tivemos três dias de treino (para jogo contra o Chile), foi bem legal, mas seria interessante todo semestre ou, pelo menos, de três em três meses ter um período de dois, três dias de treinamento da seleção”, ressalta.

Para o técnico da seleção brasileira de futebol americano, o time está em bom nível dentro da América do Sul. A fácil vitória contra o Chile prova isso. “Ganhamos bem do Chile, sem dificuldade nenhuma, e acredito que conseguimos bater o Uruguai e bater de frente com a Argentina, que, a princípio, seria o melhor desses três times. Eles têm a seleção há mais tempo, essa é a vantagem. A outra é que a maioria dos times joga perto da capital. Para eles, é muito mais fácil juntar todo mundo e treinar, o que para um país continental como o Brasil, nós temos muita dificuldade. Tem jogador da Paraíba, de Manaus, do Sul, é uma complicação”.

Outra luta é conseguir patrocínios. No jogo de Foz do Iguaçu, a seleção conseguiu o apoio da Gatorade, de maneira curiosa. A empresa lançou vídeo no Facebook, mostrando um técnico da NFL tomando um banho de Gatorade. No final, dizia que, um dia, isso podia ser tradição no Brasil. As comunidades do futebol americano no Brasil começaram a cobrar a marca, com compartilhamento do vídeo, dizendo que o fato já podia acontecer por aqui.

“Ligou um cara do Peru, que comanda a PepsiCo (marca da Gatorade) na América Latina, dizendo que chegou a notícia da repercussão lá nos EUA e que eles queriam apoiar a gente no jogo. Então, com uma campanha sem querer, feita no Facebook, conseguimos atrair a atenção deles lá nos EUA. E eles mandaram o Gatorade pra gente. Não foi um patrocínio com dinheiro, mas eles mandaram mais de dois mil litros de bebida, squeeze, barraquinha. Eles adoraram”, conta Flávio Cardia.

O presidente diz que ainda há receio em investir no esporte no País, mas vê com otimismo o futuro. “A Gatorade disse que quer conversar e existem muitas empresas que têm nos procurado também. Tem uma marca da Ambev que pode pintar alguma coisa. As marcas americanas que investem no futebol americano lá também têm procurado a gente. Mas, ainda existe muito preconceito”, lembra.

Apesar de tudo, tanto Cardia quanto Müller enxergam um bom horizonte à frente. Nos planos, uma boa participação no Sul-Americano, que vai acontecer em 2013. E o maior sonho: o Mundial, daqui a três anos. Já foram disputados quatro torneios mundiais, com duas vitórias do Japão e duas dos EUA, nas últimas edições.

“A partir do próximo mundial, acho que vão ter 12 vagas. Até hoje, eram oito. Ainda está sendo discutido quem ganha a vaga. Na Europa, por exemplo, vão os três primeiros do Campeonato Europeu. A torcida nossa é que seja dada uma dessas vagas ao campeão Sul-Americano. Ainda não é certeza, mas é a nossa vontade”, revela o treinador brasileiro.

Para que a seleção fique mais entrosada e possa encarar as competições que estão por vir, é preciso mais treinamentos e, claro, novos duelos. Segundo Cardia, a partir deste ano o calendário prevê que dezembro seja livre para a seleção brasileira. O objetivo é realizar, no mínimo, dois jogos por ano, no último mês da temporada. Em 2012, está quase certo um confronto diante da Argentina.

“Ainda estamos tentando amistosos com outros times, querendo trazer uma Austrália para o Brasil. Eles participaram da Copa do Mundo, ficaram em último, mas, para nós, é bom testar o nível com algum país que jogou mundial. Na América do Sul, temos nível melhor que os outros”, opina o presidente da AFAB.

Campeonato brasileiro único, busca por patrocínios e apoios, sul-americano e mundial, fortalecimento da base e estrutura de organização. Esses são alguns desafios para que o futebol americano se firme no País e entre no coração do brasileiro. Se isso acontecer, é touchdown!

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