Stepan Nercessian vive Chacrinha O ator que também circula pela política e botecos conta como é viver o velho guerreiro no musical que agradou público e crítica gplus
   

Stepan Nercessian vive Chacrinha

O ator que também circula pela política e botecos conta como é viver o velho guerreiro no musical que agradou público e crítica

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Dia desses troquei uma ideia cabulosa com o Chacrinha por telefone. Sério. Mas, calma, sei que o Velho Guerreiro e a sua buzina descansam em paz já há 26 anos. O papo foi com o cabra que vive o Abelardo Barbosa em “Chacrinha – o musical”, que estreou recentemente em São Paulo depois de fazer muito nego chorar no Rio de Janeiro, onde 80 mil pessoas pagaram para vê-lo em cena. Falo do ex-político Stepan Nercessian, que interpreta o Chacrinha adulto. O cara nasceu em Goiás, mas é carioca no último! Foi galã nos anos 70 e 80, mas resolveu curtir a carioquice – fato perceptível na protuberante barriga de chope. O cara tem 61 anos, trabalha desde os 14. Juntou uma grana e conseguiu um teto em um lugar bacana, na Barra da Tijuca, está casado, tem um filho de criação, gosta de receber gente em casa, dar um pulo na praia e voltar e... beber cerveja. 

Graças a ela, não precisou engordar para viver no palco um dos maiores comunicadores do País. Sua turma de amigos, ele me contou, vive o sacaneando por causa da circunferência de responsa que carrega  acima da pélvis. “Dizem para eu emagrecer, perder essa barriga escrota, mas, no fundo, eu sabia que um dia ela poderia ser útil”, disse-me ele, aos risos. Foi Fernanda Montenegro quem o indicou ao papel para o diretor da peça Andrucha Waddington. Tá ruim de costa quente o malandro? Mas Stepan não é daqueles atores que herdam trabalho porque tem um bom padrinho, não. O cara é competente nessa arte e dá um trampo já há algum tempo. “Desde pequeno eu queria trabalhar, fazer coisas, vendia o almoço para ter a janta. Meu pai me sacaneava: ‘Meu filho, não tenha pressa, vá com calma. Você é muito novo. Não tem idade nem para ser corno ainda.” 

Stepan sabe falar com seriedade. Foi vice-presidente da Câmara dos Vereadores do Rio de Janeiro e deputado federal até o final do ano passado. Mas é mesmo na gargalhada que desempenha seu melhor papel. Perguntei a ele se, após 28 anos de casamento, considerava-se um bom marido. O ator começou a resposta assim: “Ah, eu tenho o dom de iludir, né?”. E seguiu numa conversa de que muitos homens, para conquistar uma mulher, fingem um personagem bonzinho – mas que ele não. Para esses lobos em pele de cordeiro, ele acredita, depois que casam e resolvem se mostrar de verdade, a mulher não aceita a mudança. Por isso Stepan resolveu assumir a condição de pá virada desde o início do relacionamento. 

Certa vez, ele sumiu de casa por um fim de semana inteiro e uma amiga da sua esposa a questionou: “Mas como você o aceita assim?”. Se liga no que a sua mulher disse à amiga: “Ah, Stepan melhorou demais. Antigamente, sumia por dois finais de semana!”. Resumo da ópera, como me disse gargalhando: “Dessa forma, a cada dia eu só melhoro”. Malaco véio! É digno ou não do troféu bacalhau? Enquanto você não vai até o teatro vê-lo na pele (ele tá igualzinho, acredite!) do Velho Guerreiro, dá uma lida no que ele me disse sobre alguns outros assuntos, o que prova que Stepan não é apenas uma barriga de chope arrotando groselha por aí.

CHACRETES
“Ah, as chacretes... aquilo sim era sensualidade pura! Elas podiam ser feias de rosto, mas tinham de ser gostosas para serem contratadas. As dançarinas de balé dos programas de hoje fazem coreografia e não uma dança sensual. Sensualizar era a proposta das chacretes, fazer com que as pessoas sentissem tesão. Mas o Chacrinha não era pornográfico

VIDA POLÍTICA EM BRASÍLIA
“As pessoas vão lá para Brasília para se matar de trabalhar na terça e na quarta. Eu conhecia a onipresença de Deus. Mas lá, conheci a oniausência do deputado. No Congresso, você consegue não ir a vários lugares ao mesmo tempo, porque três reuniões de comissões das quais você faz parte são marcadas ao mesmo tempo e cada uma em um lugar” 

CLASSE ARTÍSTICA
“O artista tem de ser vanguarda, revolucionar, propor. E, hoje, só há repetições; está tudo igual. Todo mundo quer ter comportamento politicamente correto, porque as agências de publicidade não chamam o artista transgressor. A sociedade brasileira está se tornando proibicitária, é sim ou não, do bem ou do mal, escroto ou politicamente correto. Isso não combina com o espírito brasileiro, que está perdendo o senso de humor”

CELEBRIDADES NA POLÍTICA
“Vejo as pessoas falarem bastante do deputado Tiririca, da ingenuidade dele, que não sabe fazer nada. Olha, se o Tiririca não for o melhor deputado, faz tão pouco mal que acaba sendo um bom deputado. Ele é um cara presente e faz menos mal ao país do que os espertalhões que comandam tudo lá”

ESCÂNDALOS DE CORRUPÇÃO
“Nos últimos 20 anos, desde o Collor, todos os grandes escândalos políticos do Brasil vieram à tona não porque um homem de bem ficou indignado, mas sempre por racha em quadrilhas. A essência da denúncia no Brasil é podre. Nunca o fiscal que viu a irregularidade, ou o delegado, ou o cidadão de bem bota a boca no mundo. É sempre o cara que ficou indignado com a partilha do produto do crime. É o Pedro Collor que denunciou o esquema do PC Farias, os anões do orçamento, mensalão...”


Rodrigo Cardoso