Se você parte do pressuposto de que não existe amizade entre homem e mulher, é melhor reconsiderar sua postura. Não que os dois sexos opostos possam conviver tranquilamente sem que os hormônios, pelo menos em sonhos, entrem em erupção e cobicem, mesmo que errado, aquela amiga gostosa que passou longos anos ao seu lado, apresentando mulheres e curando sua bebedeira. Instinto masculino não escolhe a mulher que quer devorar.
Porém, se existe uma porção masculina que deixa a mulherada tranquila e não encare as femininas como um cão encarando o frango de padaria, é a galera que migrou para o lado colorido da força: os gays. Tudo bem que mulher não pensa em homem como nós pensamos nelas, isso facilita o convívio sem menores problemas. Afina, imagine você com uma amiga gostosa, linda e interessante, daquelas que se enquadram na vaga de "mãe dos meus filhos", muito íntima jogando para o seu time. Ou seja, lésbica. Que goste da mesma fruta. Viveríamos em conflito interno, entre tentar convertê-la ou respeitar sua orientação e não estragar a amizade. Complicado, né?
Tudo isso, óbvio, é culpa do nosso preconceito machista. O mesmo que nos deixa preocupados quando as bonecas que levarão nossos sobrenomes aparecem com um amigo gay em casa. Ou na casa dela. Não importa. O fato é: muita coisa passa na cabeça de um cueca nesse momento. E, mesmo sem saber o motivo real, a mente já reprime aquela cena. " Essas preocupações estão mais ligadas a preconceitos do que a qualquer outra coisa que tenha fundamento. Os amigos que uma mulher escolhe ter, por princípio, deveriam ser fruto de uma escolha dela, de mais ninguém. E o seu companheiro, seja marido ou namorado, para o bem do relacionamento, deve não só aceitar, mas entender e conhecer esses amigos", afirma a psicoterapeuta de adultos, famílias e casais, Blenda de Oliveira, psicanalista da Sociedade Brasileira de Psicanálise de São Paulo.
Para o stylist capixaba Marcio Paiva, de 31 anos, homem comprometido que reprime amizade de sua mulher com um gay é recalcado. "Não tem essa de bofe proibir a gata de andar com as 'bi'. Tento ser supersimpático com os maridos de minhas amigas e clientes. Alguns são legais, me respeitam e fim. Não levo a mulherada para o submundo da putaria. Nós, gays, não somos tão podres como vocês pensam", se defende. Para a psicanalista, a convivência entre pessoas com opções sexuais diferentes tem apenas a acrescentar à construção social do indivíduo, assim como ao seu relacionamento amoroso. "As mulheres para estarem em seus casamentos, namoros ou noivados, dependem unicamente delas mesmas. A única coisa a ser cuidada pelo casal é a possibilidade de ambos conhecerem os amigos de cada um, se for possível, apenas pela riqueza na parceria e não coibir o contato com outras pessoas", explica.
Mas, como reagir?
Blenda enfatiza que se uma relação heterossexual é ameaçada pela amizade de um ou do outro parceiro com alguém homossexual, sem dúvida, já existem outras questões ocorrendo de prejudicial nesse relacionamento. "Ninguém deixa de ser hetero ou homossexual por influência, estas escolhas são mais complexas que aparentam. De mais a mais estamos falando de pessoas adultas que, supostamente, são responsáveis por suas opções", adiciona. "A raíz desses conflitos se situa nas crenças que cada um cria em relação ao tema, além de um pensamento carregado de preconceitos", complementa a especialista.
O mais importante, em situações como essa, é uma boa conversa para esclarecer as coisas. "Tudo vai depender do grau de autonomia dessa mulher para explicar e tranquilizar seu parceiro. Há casais que não possuem uma boa parceria e muitas coisas terminam não sendo conversadas. A melhor postura é uma reação que não seja reativa, mas aberta a conhecer porque o marido está tão incomodado, às vezes esses incômodos escondem outras tensões", finaliza Oliveira.
Vale lembrar que, na maioria dos casos, os gays que são amigos de sua mulher lutam pela sua felicidade, também. "O mercado para solteiras (e solteiros, claro) está tão ruim de homem que quero mais é ver minhas clientes e amigas felizes e satisfeitas em seus casamentos. E digo mais, brigo com elas se quiserem piranhar por aí", ameaça o stylist.
Além disso, um amigo gay pode cumprir a sua função nas tarefas mais chatas de um relacionamento, como acompanhá-la ao shopping e esperá-la ou até ajudá-la a escolher roupas, ir àquele filme chato em que, no final, a mocinha virgem e recatada casa com o príncipe no cavalo branco, entre outros. No fim das contas, os gays podem pensar como mulheres, mas ainda sim podem ser bons aliados em nossos relacionamentos heterossexuais.