Dizem que eu sou um cara monocromático. Por quê? Porque a maioria das minhas roupas é preta. Ou cinza. Ou preta e cinza, tanto faz. Não tenho como negar. E não me sinto nem um pouco ofendido quando recebo tal adjetivo, pelo contrário, sinto-me muito bem, pois ele me dá a certeza de que o meu visual não tem nada de “restartiano” – ou “pelanziano”, como preferir. Além disso, ser monocromático tem outra vantagem: ao invés de postar o look do dia no Instagram, eu posso postar o look do ano, tranquilamente. Ou da década. E investir a preciosa – e sempre prestes a acabar -bateria do meu celular em coisas bem mais interessantes, como a busca por receitas de bolo, por exemplo.
Porém, eu confesso que ficaria muito chateado se me chamassem de outro adjetivo que também começa com “mono”. Quer dar um chute? Não, não é “monoball”. Também não é “monocelha”. Eu ficaria realmente triste se me chamassem de “monotemático”. Preciso explicar o motivo? Mesmo? Ok, meu caro: em minha opinião, gente monotemática é tão chata quanto a TV Senado. E previsível como as piadas do Faustão, que sempre giram torno de Ricardões e de maridos desleixados com a unha do dedão enorme.
Você conhece algum monotemático? Pois eu conheço muitos! Conheço um cidadão que só fala de economia, juro. Nas vezes em que eu - por motivos profissionais e inadiáveis - fui obrigado a almoçar com ele, senti-me surrado pelo Índice DowJones e espancado pelas intermináveis dicas de investimento que ele insistiu em me dar, mesmo depois de eu ter afirmado – de cem maneiras diferentes - que não consigo poupar um puto, nunca. Eu tentava mudar de assunto, e o cara, para a minha agonia, achava uma forma de voltar à economia. Quando falei de futebol, ele falou dos patrocinadores de times brasileiros que têm capital aberto na bolsa; quando eu comecei a falar de mulheres, ele disse que transar com uma puta de luxo duas vezes por semana é muito mais barato do que ter uma esposa. Dá para acreditar nesse cara? Mas ele não é o único – nem o mais maçante – monotemático que eu conheço, acredite.
Já ouviu falar do Valtinho do Psy? Sorte a sua. Porque o cara só fala de raves e afins. Nada contra raves e afins – que fique bem claro! -, mas só falar disso para uma pessoa que não entende nada dessa porra? Passei um churrasco inteiro tentando fugir do Valtinho do Psy, mas o ser sempre conseguia me encontrar. E pior: dava um jeito de meter as palavras “DJ”, “frito” e “bateu” nos assuntos mais variados e que nada têm a ver com esse negócio de rave.
Mas o pior de todos os monotemáticos, para mim, é um brother que vendeu a alma para o demônio em troca de duzentos quilos de wheyprotein e assinatura vitalícia da Men´s Health, de acordo com o que me jurou a boca grande. E se engana, completamente, quem pensa que eu o considero o pior dos monotemáticos por causa da minha falta de interesse pelo universo fitness. Longe disso. O problema é que ele, além de conversar apenas de maneiras para evitar o catabolismo e sobre os exercícios mais eficientes para secar, ainda tenta me influenciar utilizando métodos bem imperativos. Tá ligado aquelas crianças chatas que jogam água no cigarro da mãe? Outro dia ele fez algo parecido: deu um tapão no sachê de maionese que estava prestes a turbinar o sabor da minha empada. Tomei um puta susto. “Que porra é essa, irmão?”, perguntei. E ele, como se fosse um pai que acabou de encontrar uma pedra de crack nas coisas do filho, respondeu com uma nova pergunta: “Eu é que pergunto?”. Como assim?
E mesmo quando o monotemático opta por falar sobre um tema que me agrada, como rock, ainda acho um pé no saco. Por quê? Porque dá até medo de ser maltratado depois de mencionar o Caetano Veloso. Ou de assumir que eu curto o som do Zeca Pagodinho. Saca?
Os monotemáticos, geralmente, ficam cegos - e dispostos a tudo – pelo único tema que parece ter importância na vida deles. E aí de você – ou de mim! – se disser algo como “não gosto de política” ao monotemático que é “mono” por falar, apenas, de política; imediatamente você será transformado em motivo de passeata na Paulista e em bandido do mês no Facebook. Os monotemáticos, por defenderem interesses únicos, são como muitas mães de um só filho: fanáticas.
E namorar gente assim, já imaginou? Já? Eu já vivi na pele, o que é bem pior. Tive um caso quase sério – porque não dá pra pensar em algo realmente sério com alguém assim - com uma moça que só falava de filosofia e de revoluções sociais. Sinto um leve ataque de pânico quando me lembro das coisas que já passei ao lado dela. O quê? Um dia eu fiz a besteira de lavá-la a uma festa de família, e a doida, do nada, começou a falar de Platão à minha avó. Coitada da velha. E pior: chamou a minha tia de capitalista. Resultado: perdi 12% da herança naquele dia.
Gosto mesmo é das pessoas multitemáticas, que falam – e que estão dispostas a aprender -a respeito dos mais diversos temas; daquelas que não negam a necessidade de adequarmos o nosso discurso ao ambiente em que estamos e, principalmente, ao ouvinte a quem o dirigimos.
E acho incrível – “FODA” mesmo, no melhor sentido da palavra! - quando um multitemático – daqueles bem ecléticos! – nos ajuda a perceber que somente na terra do preconceito – e dos rótulos desnecessários - o cidadão que curte música sertaneja não pode entender de cinema argentino, o lutador de jiu-jitsu não é capaz de conhecer os poemas do Leminski e a moço de bíceps malhado nunca saberá nada a respeito dequalquer coisa que os “cultinhos” insistem em chamar de papo-cabeça.
Sobre Ricardo Coiro
Vive entre o soco e o sopro. Morre de medo do morno e odeia caminhar em cima do muro. Acha que sensibilidade é coisa de macho e que estupidez é atitude de frouxo. Nunca recusou um temaki ou um café.
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