As tiradas de Angeli Inspire-se com o sarcástico universo do cartunista que tem um humor pra lá de ácido e é macho o bastante para ir direto ao ponto gplus
   

As tiradas de Angeli

Inspire-se com o sarcástico universo do cartunista que tem um humor pra lá de ácido e é macho o bastante para ir direto ao ponto

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Se você está quase na casa dos 30 e até agora não entende como a molecada de hoje em dia consegue assistir Bob Esponja, com certeza já curtiu o trabalho de um dos mais conhecidos cartunistas brasileiros – mesmo sem se dar conta. Afinal, quem não se lembra das animações que a Globo passava nos intervalos de filmes?

Criador de personagens como Rê Bordosa, Bob Cuspe e Wood & Stock, o grande barato de Arnalgo Angeli Filho, 55, é ironizar a vida cotidiana na metrópole e criticar praticamente tudo. O homem que editou a extinta revista Chiclete com Banana não poupou nem a si mesmo, e chegou a fazer uma série de caricaturas autocríticas onde ele é seu próprio personagem.

Autodidata, Angeli aprendeu a desenhar copiando os trabalhos de Jaguar, Millôr Fernandes e Ziraldo, e aos 14 anos publicou seu primeiro desenho na revista Senhor. Nos dez anos seguintes o chargista teve o primeiro contato com os cartuns underground do norte-americano Robert Crumb e do francês Wolinski, além de colaborar com diversos fanzines.

Influenciado pelo movimento punk, nos anos 80 Angeli ainda lançou pela editora Circo a revista Chiclete com Banana, onde apresentou um novo elenco de personagens, como Walter Ego, Rigapov, Rhalah Rikota, Bibelô, Meiaoito e Nanico, Ritchi Pareide, Aderbal e Os Skrotinhos. No início da década anterior, ele ainda inaugurou o espaço de charge política no jornal Folha de S. Paulo, onde publicou tiras diárias até 1982. 

Dotado de uma perspectiva singular sobre a vida e os relacionamentos, é possível descobrir a essência de Angeli através de suas obras. "Depois de um tempo as charges políticas começaram a proporcionar uma popularidade maior a figuras que eram alvos da crítica, o qual definitivamente não era o propósito. A partir daí passei a me dedicar mais às tiras", desabafa o artista numa entrevista exibida na mostra.

Suas Lovestórias refletem o profundo conhecimento do cartunista sobre relacionamentos e o temperamento instável das mulheres. "Não sou de usar as mulheres e depois jogar fora. Tranco todas no armário", desabafou ele à imprensa em uma ocasião.

Adorador das letras de Sid Vicious e fã dos Mutantes, Angeli traduz em suas obras os sentimentos reprimidos daqueles que vivem a rotina turbulenta das grandes cidades. Em um de seus personagens mais populares, a Rê Bordosa, o artista retrata uma quarentona alcoolatra e desbocada, cujas histórias abordam as manias e desejos de uma ninfomaníaca que não tira o cigarro da boca nem para falar. O personagem deu tão certo que chegou até a  co-estrelar um longa metragem de animação, o Wood & Stock: Sexo, Orégano e Rock'n'Roll.

Para o cartunista, as mulheres não passam de umas chatas. "A gente leva pra passear, leva pra dançar, leva ao zoológico, leva ao cinema e, mesmo assim, elas vivem reclamando que nós nunca as levamos a esse tal de orgasmo", comenta Angeli.

Já com Bob Cuspe, Angeli remonta a onda punk que invadiu a periferia de São Paulo num anarquista mal humorado versão tupiniquim, que migrou dos EUA e da Inglaterra direto para a capital paulistana. O autor confessa que à medida que se envelhece percebemos que a adolescência é mais longa do que esperava, e também critica a equação "mulher pelada, cerveja, churrasco e futebol" adotada como identidade masculina. 

Sem papas na língua, como em suas tirinhas, Angeli afirma que não suporta "homem parado em porta de bar esperando mulher passar".

Hoje em dia o cartunista, que chegou a trabalhar como roteirista no programa TV Colosso da Rede Globo e já teve trabalhos publicados na Alemanha, França, Itália, Espanha e Argentina, faz charge política na página 2 da Folha de São Paulo. Seu legado influenciou uma geração de artistas em diversos segmentos, como teatro, TV, histórias em quadrinhos, cinema, música, entre outros.

Quem ainda não conhece ou deseja relembrar personagens e momentos da carreira do artista, vale a pena dar uma conferida na exposição dedicada a Angeli no Itaú Cultural, que rola até o dia 29 de abril – e a entrada é gratuita. A mostra traz 880 obras assinadas pelo cartunista e 80 originais, além de 20 fotos de seu arquivo pessoal.